Espaço de discussão e reflexão sobre a experiência do olhar e suas reverberações no corpo na construção/remontagem do espetáculo de dança contemporânea "feche os olhos para olhar" da desCompanhia de dança.

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

“feche os olhos para Olhar” em 2013.

2013 foi um ano importante para a desCompanhia de dança, pois conseguimos compartilhar o nosso espetáculo “feche os olhos para Olhar” nos estado de Ceará (Itapipoca/Fortaleza) e São Paulo (Capital e Votorantim) através do Prêmio Funarte Petrobras de Dança Klauss Vianna 2012. Também apresentamos ele no Projeto Modos de Existir do SESC Santo Amaro (SP). Ficamos felizes em poder dar continuidade a essa obra que nasceu em 2010 depois de quase 1 ano de pesquisa. Desejamos a todos um Feliz Natal e um Próspero Ano Novo!

Equipe desCompanhia

sábado, 30 de novembro de 2013

Experiências da Circulação Klauss Vianna – por Yiuki Doi

Dezembro, reta final da corrida, quase terminando as atividades do Prêmio Funarte Petrobras de Dança Klauss Vianna 2012 que a desCompanhia foi agraciada. Falta somente a atividade OLHARES PARTILHADOS, evento de encerramento do nosso projeto que acontecerá amanhã, onde compartilharemos nossas experiências artísticas vividas na circulação do espetáculo feche os olhos para Olhar nos estado de Ceará (Itapipoca/Fortaleza) e São Paulo (Capital e Votorantim) com o público curitibano.

Apesar de utilizarmos o termo prêmio, acredito que a palavra mais apropriada é o sacro-ofício* para o projeto que realizamos esse ano. Ser contemplado pelo Prêmio Klauss Vianna é uma conquista de quatro anos que a companhia vem buscando; inclusive, para isso ser concretizado, investimos até numa consultoria sobre como escrever projeto para o Klauss Vianna - uma “ajuda ao universitário” experiente que passam comumente nesse edital. Resultado de 12 anos de esforços junto à consultoria culminou na conquista desse edital tão sonhado pela primeira vez. Mas, apesar da alegria, ser aprovado no edital de Circulação da Funarte foi somente o início da uma romaria** que sucedeu durante o ano, pois não é fácil executar uma circulação nacional com recurso financeiro mínimo e possuir o desafio em conseguir pautas e públicos nas cidades que não são familiares para a companhia. Mas como toda romaria com sacro-ofício, o final da jornada é uma sensação de alegria e satisfação por termos cumprido o que acreditamos ser o nosso o papel como artista.

*Sacro-ofício no sentido de ofício sagrado.
**Romaria não é ruim, pode ser ótimo, se não pode ser isto, acredito que não existiria.

Compartilho a seguir alguns dos aprendizados das viagens internas e externas durante as nossas temporadas.

  1. Viajar é necessário para si reconhecer – O valor da arte está em oferecer experiências estéticas para que o público possa transcender a si, e dessa maneira, voltar ao mundo com a potência de ação, seja para onde e como for. Ultimamente tenho pensado que se houver uma forma de sustentar a minha dança dentro de Curitiba, para o público curitibano, não teria problema viver só disso. Não sou bairrista, somente acredito no crescimento do micro para o macro e quero fazer diferença na cidade em que vivo. No entanto, circular é importante para ter a referência da nossa arte no mundo, nesse aspecto a receptividade do público paulistano e a generosidade do público cearense alimentaram a minha alma para estar mais forte junto a desCompanhia de dança.
  2. São Paulo, uma metrópole que engole as pessoas – Uma cidade megalomaníaca para minha pessoa, tudo é grande em escala e número: avenidas imensas, prédios altos, nº de apresentações culturais, estabelecimentos comerciais, restaurantes, carros, pessoas, etc. São Paulo me faz sentir como um pó que entra e sai na cidade sem fazer uma cócega sequer. Não importa se temos o apoio do MinC para circular, a cidade de São Paulo engole as pessoas – beirando ao anonimato a maioria dos reles mortais. Nessa conjuntura, para o sucesso da temporada na cidade é fundamental poder inserir as apresentações num evento cultural tradicional da cidade, ou apresentar num espaço cultural que já tenha uma rotina com certo público já cativo, ou talvez realizar parceria com alguma faculdade de dança ou instituições afins. No nosso caso da circulação em São Paulo foi importante a inserção do nosso espetáculo no evento Semanas de Dança do Centro Cultural São Paulo. Graças à articulação da nossa produtora, Cindy Napoli, e ao apoio do Centro Cultural de São Paulo, tivemos uma temporada com bastante público em São Paulo.
  3. A estrutura organizacional e sua relação com a linguagem cênica do grupo – Durante a temporada na Cidade de Votorantim-SP, nós fomos conhecer o Coletivo Cê, um grupo de artista com formações variadas (teatro, dança e música). A sede do coletivo era uma associação de bairro que estava desocupada – na busca de sustentabilidade do fazer artístico o grupo fez uma proposta de ocupação cultural que foi aceita pela comunidade. O interesse pela cultura popular aliada à própria origem da sede faz com que o grupo se relacione intensamente com a comunidade local. A impressão que tivemos é que isso influencia na forma organizacional de trabalho do coletivo e na própria criação da obra “Desmedida” que é itinerante e interativa nas ruas do bairro. No caso da desCompanhia de dança, a nossa sede é o Vila Arte Espaço de Dança - uma escola de dança da família da nossa diretora artística Cintia Napoli. O fato de termos um espaço para ensaiar sem pagar aluguel junto à liberdade de escolhas artísticas que o espaço proporciona contribuem muito para o desenvolvimento da nossa atual linguagem cênica.
  4. Um olhar externo para nos oferecer orientações após as apresentações - Os espetáculos da desCompanhia trabalha muito com estados corporais, improvisações, composição em tempo real, etc. No caso do espetáculo O feche os olhos para Olhar, ela é uma obra que apropria o espaço, ambiente e o público transformando tudo como parte interativo da obra; então, em cada cidade, a obra transmuta sua forma de manifestar, mas sempre mantendo a sua essência dramatúrgica. Nesse tipo de trabalho, o bailarino criador precisa do olhar externo da diretora artística Cintia Napoli para saber o que funcionou e o que não funcionou durante as apresentações. Apesar de no ensaio e na remontagem da obra feche os olhos para Olhar a Cintia estiver presente o tempo inteiro, durante a temporada do Klauss Vianna ela foi impossibilitada viajar conosco, pois ela também ocupa o cargo de diretora artística do Balé Teatro Guaíra desde 2012. Dessa maneira, dançar sem ter retorno de um olhar externo foi muito difícil para gente, mas naquela situação, mais do que nunca, foi importante acreditar nos nossos ensaios e anos de trabalho coletivo junto. Acho que amadurecemos muito viajando sem a nossa diretora artística.
  5. Não basta apresentar nas cidades, é necessário articular redes de contatos e buscar próximas oportunidades de sustentabilidade da nossa arte. Anos atrás quando fomos para São Paulo pelo edital de ocupação da Caixa, ou para participar da 3ª Mostra Lugar Nômade Dança, somente cumprimos a nossa temporada e voltamos para casa. Dessa vez, entre as apresentações de Votorantim e São Paulo reservamos nosso tempo para articular nossas redes de contato antes da temporada de São Paulo. Dentro da correria, montamos um material de venda (catálogo, proposta artística e vídeo) dos nossos últimos quatro trabalhos e fomos à luta (bailarinos e produtora). Visitamos alguns SESCs, fomos na Galeria Olido e entregamos convites para assistir nosso espetáculo para alguns dos curadores. Acreditamos que essa mobilização também proporcionou a nossa participação no Projeto Modos de Existir - SESC Santo Amaro - SP (29.10 à 10.11.2013). Na atual conjuntura econômica nossa, infelizmente, não somos somente bailarinos para criar e apresentar a nossa dança, nós precisamos buscar a sustentabilidade do nosso fazer artístico. Sei o quanto foi difícil a todos, realizar tudo isso e ainda apresentar no Centro Cultural de São Paulo, mas estou feliz de termos mantido os nossos comprometimentos e termos feito uma ótima temporada em São Paulo.
  6. Nordeste, lugar onde o corpo dilata naturalmente. Primeiro dia da apresentação em Fortaleza, quando fui pegar meu figurino estranhei a situação: meu corpo quente e dilatado junto ao figurino do feche os olhos para Olhar. Nunca tinha dançado esse espetáculo numa cidade tão quente, dessa maneira não lembrava o meu corpo nessa vibração pegando o meu figurino. Dei risada e compartilhei isso com a bailarina Juliana Adur. A nossa apresentação correu de forma tranquila, gostei da sensação que ficou após o espetáculo, porém tive retorno de um dos públicos que o nosso trabalho era leve. Estranhei, pois existem elementos que são viscerais dentro do nosso espetáculo para mim, porém quando recordei a apresentação realizada, realmente constatei que o meu estado corporal estava mais leve e volátil naquele dia; dessa maneira, muitos das questões emocionais que norteiam as minhas improvisações, que tenho liberdade de variar dentro de certa estrutura, naturalmente tinham sido mais leves. Percebi que nas apresentações dos seguintes dias eu precisava fechar um pouco o meu corpo, contrair emocionalmente e fisicamente em alguns momentos – dar maiores tensões na obra por minha parte. Acho que consegui realizar isso nos dias seguintes. Constatei que o clima e o ambiente possui um poder imenso sobre a nossa maneira de dançar, principalmente para nossa companhia que utiliza muitos estados corporais em cena.
  7. Taxista de Fortaleza são mais flexíveis do que os de Curitiba. Mesmo com edital do MinC, economizar é preciso, essa foi a nossa realidade e aceitamos isso. Nós sabemos que um taxi comum geralmente transporta 4 pessoas, porém em Fortaleza estávamos em 5 pessoas para se deslocar. Dessa maneira, quando alguém de nós parava um taxi, entravamos todos de uma vez no carro, logo depois nós conversávamos normalmente, alegres como sempre somos. Nesses momentos, às vezes eu via o olhar do motorista pelo retrovisor, mas os taxistas de Fortaleza são mais tranquilos comparados aos taxistas de Curitiba (Ufa, que bom). Enfim, compartilho isso, pois viajar pelo Klauss Vianna não significa que tudo é maravilhoso e cor de rosa: precisamos dividir quarto, realizar uma agenda coletiva, transformar o quarto do hotel em escritório de projeto, calcular a quota financeira para a refeição, etc. Manter o bom humor durante 15 dias é difícil, foi um desafio e confesso que aprendo muito com os demais integrantes da desCompanhia de dança.
  8. Parceria com teatros universitários, alunos e professores correlacionados à arte funciona muito bem. Na temporada na cidade de Fortaleza, a priori o espaço ideal para o nosso espetáculo era o SESC IRACEMA. Também tentamos inserir nosso trabalho dentro da programação do Bienal Internacional de Dança do Ceará. Porém, na prática as coisas são difíceis mesmo – nada disso aconteceu. Então, o produtor local Rodrigo de Oliveira conseguiu uma pauta no Teatro Universitário Paschoal Carlos Magno, na própria Universidade Federal do Ceará onde a Thereza Rocha, integrante do nosso projeto do Klauss Vianna, ocupa o cargo de docência. No final das contas, acho que foi genial nós termos apresentado dentro da Universidade. No colóquio Olhares Diálogos Dança, da Marcia Tiburi e Thereza Rocha, tivemos em torno de 70 pessoas atentas e entusiasmadas como público. Os três dias da apresentação do feche os olhos para Olhar foram lotadas de público carismático. Também percebi a importância do Teatro Universitário ser a sede do grupo de teatro Pavilhão da Magnólia que nos acolheu e ajudou na divulgação da nossa temporada. Outra coisa primordial para o sucesso da temporada em Fortaleza foi termos um produtor local eficiente. Muito obrigado a Entretantas Conexões em Dança que nos indicou o Rodrigo de Oliveira.
  9. Possuir bons produtores locais é essencial para o sucesso das temporadas, mas possuir produtores cicerones e companheiros não tem preço durante as viagens. Esse foi uma observação da produtora da desCompanhia, Cindy Napoli, fez e que todos nos compartilhamos. Se viajarmos para cidades em que não conhecemos a cadeia produtiva da dança, é necessário possuirmos um produtor local eficiente. Mas descobrimos que quando deparamos com produtores locais como Vera Almeira (Votorantim-SP), Rodrigo Oliveira (Fortaleza-CE) e Gerson Moreno (Itapipoca-CE) que possuem um cuidado a mais do que um relacionamento profissional, tornando-se um amigo e cicerone que apresenta a cidade e seus fomentos culturais (museu, boteco, restaurante, hábitos, músicas, vídeos, etc.) faz toda diferença para a troca que nós artistas buscamos com o mundo. Além do mais, para nós, viajar em temporada também é estar atento as oportunidades da sustentabilidade da nossa arte. Ou seja, é cansativo em muitas situações, e nessa correria de vida de artista contar com aconchego e afago desses produtores locais não tem preço! Um agradecimento especial a esses produtores queridos.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Circulando pelo Nordeste

Mais 15 dias fora de casa, o que eu faço com a cachorra? minhas crianças vão na lembrança. E lá se vai a desCompanhia pelo Nordeste Brasileiro. Só então chegando lá, redescubro o prazer de dançar. E aqui respondo umas perguntas que sempre me são feitas. Para onde tua dança te leva? Porque você dança? Danço para sempre ter essa sensação, e nessa circulação em especial aprendi um pouco dançar com as palavras, e porque não com os ouvidos, ouvindo Márcia Tiuri e Thereza Rocha percebo que minha dança é bem mais utilizada e aproveitada em todos os sentidos.
Circular 15 dias pode parecer pouco, mas são 15 dias de convivência e novas amizades intensas, pessoas que passam pela gente, e que sem perceber nos roubam da gente mesmo, nos emprestando seus sotaques, alegrias e generosidade, conhecer cada um foi uma delícia.
Reconhecer um trabalho sério em dança mesmo que seja no sertão, perceber que é aí para mim que a dança unifica, junta forças e ganha o mundo.
Saindo de Curitiba, cinza e fria para Fortaleza com um sol arretado e uma alegria de viver me recorda um dança que se discute em todo canto. PRONTO! Agradeço mais uma vez o Prêmio Klauss Vianna 2012 por essa vivência fantástica e que venham muitos e mais prêmios como esse para poder misturar cada vez mais a dança por todo o Brasil, aproximando e instigando o pensamento em dança em muita gente por ai.


                                                                                                                Peter Abudi